A palavra “interdisciplinaridade” entrou recentemente no vocabulario da pedagogia juridica, mas o sentido da palavra nao e de modo algum univoco. Ha pelo menos tres sentidos recorrentes, embora muito diferentes:
1) Interdisciplinariedade como analise do direito baseada numa disciplina diferente. Este e o sentido dominante. O caso mais evidente e o da analise economica do direito, uma disciplina que procura subordinar o estudo do direito ao metodo da economia, em especial da micoreconomia. Para muitos praticantes da disciplina, o estudo do direito nao deveria ser mais do que um capitulo do estudo "aplicado" da economia.
1) Interdisciplinariedade como analise do direito baseada numa disciplina diferente. Este e o sentido dominante. O caso mais evidente e o da analise economica do direito, uma disciplina que procura subordinar o estudo do direito ao metodo da economia, em especial da micoreconomia. Para muitos praticantes da disciplina, o estudo do direito nao deveria ser mais do que um capitulo do estudo "aplicado" da economia.
2) Interdisciplinariedade como “educacao liberal” na periferia da dogmatica juridica. Esta versao e a unica que encontrou expressao em algumas faculdades de direito portuguesas ate ao momento. O estudo do direito e concebido, de acordo com o modelo tradicional, como estudo dogmatico. O nucleo do curso de direito — o nucleo “serio” — e constituido pelas cadeiras tradicionais (direito das obrigacoes, administrativo, criminal, etc.) ensinadas de acordo com o metodo tradicional (conceitos gerais + institutos centrais + classificacoes e tipologias). As cadeiras de outras disciplinas sao marginais e aparecem como "valculas de escape" que servem para os alunos se libertarem dos aborrecimentos dos estudos juridicos, mas que nao sao para levar muito a serio. Um jurista e um jurista; o resto e floriado.
3) Interdisciplinaridade como estrategia epistemologica. Neste sentido a interdisciplinaridade e colocada ao servico de uma concepcao critica do conhecimento, na linha do pragmatismo, em que as “falsas necessidades” geradas pelas disciplinas sao desestabilizadas no espirito filosofico de que o saber e geral. Em vez de se rejeitar as disciplinas, no entanto, procura-se a pluralidade de metodos, mostrando a parcialidade das varias “ciencias” e mobilizando os recursos intelectuais de uma contra outra. Esta forma de interdisciplinaridade rejeita a separacao entre cadeiras juridicas e cadeiras auxiliares, depositando nos programas das cadeiras mais tradicionais uma pluralidade de metodos.
Interdisciplinaridade no estudo do direito? Sim, mas no terceiro sentido. Como e possivel que um aluno de direito em Portugal possa estudar responsabilidade civil sem compreender a economia do risco e dos seguros? Que sentido faz ensinar a responsabilidade do produtor ou a formacao de contratos sem uma compreensao razoavel de ideias como eficiencia (que nao e o mesmo que eficacia... !!!) ou assimetria de informacao? Ao mesmo tempo, a explicacao economica pode ser "desestabilizada" com elementos de psicologia social, de filosofia do direito e teoria politica normativa. Finalmente, a arrogancia normativa pode ser perturbada pelo estudo da genealogia historica das formas juridicas ou pela teoria social critica, como a semiotica ou o estruturalismo. Tudo isto, naturalmente, suplementado por uma compreensao profunda dos metodos comuns do raciocinio juridico que paradoxalmente sao obscurecidos pelo metodo expositivo dominante no ensino do direito. Muito mais importante do que decorar os "pressupostos" da gestao de negocios e saber raciocinar por analogia e mobilizar com seguranca para o "problema" os argumentos ou "topicos" comuns do pensamento juridico. O direito nao e uma disciplina, mas uma instituicao social fascinantemente complexa que pode ser observada de varios pontos de vista largamente parciais e ocasionalmente "incomensuraveis".
No meu entender, o passo mais urgente e introduzir a analise economica nos programas das disciplinas tradicionais. Trata-se, porem, de um pequeno passo e seria um erro parar por ai. Mas parece-me incrivel que um jurista recem-formado tenha dificuldade em perceber, por exemplo, que a “forma societaria” nao e sobretudo um instrumento para organizar a producao, mas sim para acumular capital, ou mesmo que producao significa combinar e recombinar factores de producao com o objectivo de gerar riqueza, que riqueza pode significar utilidade ou “valor monetario”, etc, etc, etc. As cadeiras introdutorias de economia sao demasiado gerais e marginais para suscitarem o interesse e atencao de jovens licenciandos em direito. O fundamental e ensinar as aplicacoes. Mais do que transformar juristas em economistas aplicados, trata-se de fazer com que compreendam a estrutura economica dos problemas.
1 comentário:
O direito não é uma disciplina, mas uma instituição social fascinantemente complexa que pode ser observada de vários pontos de vista largamente parciais e ocasionalmente "incomensuraveis".
Frase muito bem formulada que contraria muitos juristas e operadores mecânicos do direito que não vêem nele mais que um conjunto de normas a serem seguidas, ignorando a interdisciplinaridade de tal forma que nos dá a crer que o Direito se sustenta e basta por si só.
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