Não será que a forma como a opinião pública mostra a sua rejeição às sentenças judiciais limita a independência do poder judicial? Interessante artigo de Cass Sunstein, de Chicago. Na verdade, se existe um bias sistemático da opinião pública, uma perspectiva consequentalista que tenha em conta esse sentimento de rejeição poderá gerar um impacto excessivo na aplicação da lei.
O abstract:
At first glance, it is puzzling to suggest that courts should care whether the public would be outraged by their decisions; judicial anticipation of public outrage and its effects seems incompatible with judicial independence. Nonetheless, judges might be affected by the prospect of outrage for both consequentialist and epistemic reasons. If a judicial ruling would undermine the cause it is meant to promote or impose serious social harms, judges have reason to hesitate on consequentialist grounds. The prospect of public outrage might also suggest that the Court's ruling would be incorrect on the merits; if most people disagree with the Court's decision, perhaps the Court is wrong. Those who adopt a method on consequentialist grounds are more likely to want to consider outrage than are those who adopt an interpretive method on nonconsequentialist grounds (including some originalists). The epistemic argument for attention to outrage is greatly weakened if people suffer from a systematic bias or if the public view is a product of an informational, moral, or legal cascade. There is also a strong argument for banning consideration of the effects of public outrage on rule-consequentialist grounds. Judges might be poorly suited to make the relevant inquiries, and consideration of outrage might produce undue timidity. These points have general implications for those who favor popular constitutionalism, or judicial restraint, on democratic grounds. An understanding of the consequentialist and epistemic grounds for judicial attention to public outrage also offers lessons for the decisions of other public officials, including presidents, governors, and mayors, who might be inclined to make decisions that will produce public outrage.
3 comentários:
Ultimamente os escritos de Cass Sunstein sao mais parra que uva, mas o tema tem interesse. Como nao-consequencialista e pessimista acerca do apuramento "epistemico" da (dita) opiniao publica, acho pavorosa a ideia de que os tribunais devem ponderar as mensagens vindas da praca publica. Mas factualmente nao ha grande duvida que, especialmente nos EUA, a opiniao publica influencia os tribunais.
E interessante verificar como a (chamada) Escola de Chicago se tem transformado. Richard Posner tornou-se aquilo a que ele chama "pragmatista". Longe vao os tempos em que Posner desenvolveu grandes teoria morais -- muitas vezes pouco coerentes -- para fundamentar a eficiencia. Agora e "eficiencia so as vezes" e "pragmatismo contra moralismo".
Cass Sunstein, em tempos o expoente liberal-social numa escola de liberais classicos e conservadores, tranformou-se num "pragmatista", a la Posner, mas com uma inclinacao mais a esquerda.
A mim parece-me que em parte isto se deve a complexificacao tecnica da AED, que se tornou uma disciplina largamente esoterica (embora tecnicamente evoluida) na era Polinsky, Shavell e Kaplow, caracterizada pela total ausencia de contexto juridico (como analise de precedentes ou leis) e pelo uso e abuso de "pressupostos". Se, por um lado, se ganhou em rigor e visao de conjunto, por outro a disciplina parece paroquializar-se e perder contacto com o dominio da "policy". O paradoxo e que o "prgamatismo" de Posner e tudo menos "rigoroso" -- e uma combinacao de intuicao conservadora, analise economica semi-tecnica e rejeicao do que Posner, como sempre deliciosamente ironico, chama "moralismo academico" (leia-se: Dworkin!)
Eu diria que sim, que os juízes devem levar em conta a opinião pública nas suas decisões. Em particular no âmbito da jurisdição criminal, julgo ser mesmo imperativo que isso suceda por via das chamadas considerações de “prevenção geral de integração” (o que os norte-americanos chama, segundo julgo, “denunciation”). Como se sabe, aquele chavão traduz a necessidade de a aplicação da pena ter como objectivo (de entre outros) reafirmar a validade da norma violada pelo agente do crime, algo que só pode ser efectivo onde se considere as expectativas da comunidade. Mas atenção: o limite é o da culpa, do grau de culpa, do agente (e também as exigências de reabilitação, onde ainda se acredite nelas). Caso contrário, é a funcionalização do indivíduo.
PS: excelente blogue. Parabéns.
penso que sim, mas não a ponto de influenciar o rumo de suas decisões. Concretizando: a opinião pública deve ser considerada no sentido de que as decisões dos juízes devem ser consequentes, isto é, deve-se vislubrar quais seriam as consequências de uma decisão antes de proferí-las. Contudo, caso a devida preservação de um direito fundamental colida com o que pense a opinião pública a respeito do "mérito" da causa, deve o juiz adotar postura corajosa e contrariá-la. Exemplo que me vêm à mente no momento seria caso em que prova cabal da culpa do sujeito viesse a ser produzida de forma ilícita. Deveria o Juiz tê-la como lícita somente ante ao que pensa a opinião pública? penso que não.
Flávio Lucas (Juiz Federal, Rio de Janeiro - Brasil)
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